sábado, 12 de janeiro de 2013

Sob a Marca do Dragão - Cap. 4 (parte 2 de 2)

fotografia de
Sofia Morgado
Diana arrumava as coisas em volta, enquanto seu pai, sentado, trabalhava o couro. Procurava na sua mente as palavras mais adequadas para abordar o assunto com ele. Tinha uma boa oportunidade para fazê-lo, pois estavam sozinhos. De vez em quando ele olhava-a como se percebesse que lhe queria dizer algo.
- O que queres rapariga? Desembucha de uma vez!

Tinha sido apanhada desprevenida.
- Eu?!
- Sim, o que queres?

Diana hesitou.
- …Um destes dias sonhei com um momento em que era bem pequena…

Mauro levantou o sobrolho e voltou a olhar para o trabalho que tinha em mãos. Diana pensou que já que tinha começado, teria de arriscar.
- Sonhei que a minha mãe de sangue me disse que eu teria de ir para longe, pois corríamos perigo!...
- Estou a ver… - disse ele entre dentes.
- Porque correríamos perigo é que não percebi! Penso que era demasiado pequena para o compreender.
- E o que esperas que te diga?

Diana avançou até ele e, baixando-se e olhando-o de frente, resolveu perguntar-lhe directamente:
- De que tinha ela medo?
- Apenas sei dizer-te que tinha algo a ver com a magia. – Respondeu Mauro de forma seca.
- Será que teve algo a ver com o incêndio? Como foi que aconteceu?

Tornava-se cada vez mais claro que Mauro não queria falar sobre aquilo.  Ele pareceu remoer na questão até que acabou por responder. 
- Foi um incêndio, rapariga! Como esperas que tenha acontecido?! Porque insistes neste assunto?!
- Porque tento perceber o que aconteceu! Porquê?!
- Não cuidámos de ti, Alba e eu? Não te demos uma família?!
- Não é disso que se trata!... Porque é que este assunto vos irrita sempre tanto?!
- Irritar-me?!? Achas que não deva irritar-me? – Disse visivelmente alterado e levantando-se do banco onde estava sentado - Não foste a única a perder família naquele dia…!
- Como assim?! – Diana não sabia de que ele falava.

Mauro andou em volta da mesa onde trabalhava. Parecia ter falado mais do que queria. Diana continuava a inquiri-lo com o olhar. Ele aproximou-se de si, segurou-lhe a mão e falou, finalmente, numa voz mais calma.
- Junto de teus pais, estava minha irmã e sua filha… uma menina que tinha a tua idade!

Diana não sabia o que dizer, o seu queixo pendia com a surpresa.
- Era a mãe de Dália e Hugo.
- Perdoai a minha insistência! Não sabia…! - Dizia Diana colocando a outra mão em cima das de Mauro, que seguravam a sua.
- Sobrinhos ou não, preferimos ter-vos por igual e nunca contar o que acontecera. Eram todos pequenos, mais rapidamente esqueceriam o sucedido. Mas tu, tu sempre quiseste saber mais, sempre perguntaste! Nunca deixaste ir!...
- Deve ter sido terrível para vós!...
- Parece-me que aceitei melhor o que aconteceu do que tu! Porque não o aceitas? Porque não deixas ir?

Diana hesitou antes de responder.
- O que elas faziam lá?
- Minha irmã trabalhava na casa da tua família. Alba tinha-te trazido para passar uns tempos connosco, parece que a pedido da tua mãe de sangue. Depois soubemos o que aconteceu e… a tua mãe… Alba, não tinha sido agraciada pela Deusa; não tínhamos filhos… Dália era apenas um bebé e o marido de Ilena, minha irmã, foi-se embora e… cuidámos de vocês como se fossem nossos filhos!
- Meu pai… - começou Diana, mas Mauro interrompera-a.
- Por isso, pergunta agora o que queres e deixa o assunto ficar no passado de vez – onde pertence!

Face a tal revelação, as perguntas pareciam perder importância. Diana forçava-se a encontrá-las. Poderia não voltar a ter outra oportunidade para fazê-las.
- Dizeis que minha mãe estava assustada por algo que tinha a ver com a magia…?
- É só o que sei.

Diana pensava em silêncio.
- Agora percebo porque esse assunto vos afecta tanto e porque nada quereis saber de magia…! Ainda assim vós me acolhestes…!
- Porque não havia de fazê-lo?
Diana encolheu os ombros.

- Que mais queres saber?
-... O incêndio teve algo a ver com o perigo que corriam?
- Nada sei sobre esse assunto. Prefiro pensar que o perigo que a tua mãe de sangue pressentiu foi o próprio incêndio!
- Minha mãe...Alba ou a vossa irmã contavam algo sobre como era lá por casa?
-... Alba gostava muito deles, dizia que eram boa gente, preocupados com o bem-estar dos outros em volta. Não esqueço as vezes que nos ajudaram através de minha irmã Ilena!... Alba dizia que Neusa andava nervosa com alguma situação relacionada com o seu pai, o teu avô... algo que tinha por resolver.
- Uma situação?!...
- Nada mais sei!
- Sei que não gostais de falar destes assuntos, mas tenho que perguntar… o que sabeis sobre a minha marca e a sua magia?
- Apenas sei que é um símbolo da magia que corre no sangue da vossa família; o poder do dragão da lua. Nada mais sei. Neusa era uma mulher respeitada pelo povo, assim como o seu pai, mas os tempos mudaram… Este tornou-se um assunto muito perigoso e muitas histórias se contam, já nem se sabe muito bem se com um fundo de verdade ou com algum propósito!

Diana sentia que cada caminho se lhe afigurava sem saída. Precisava de respostas e temia agora que o seu pai de criação também não as tivesse.
- Ilena era a mãe de Dália e Hugo? – acabou por perguntar.
- E de Luana.
- Luana era a criança… ?
Ele anuiu.
- Teria mais ou menos a tua idade.

Diana registava mentalmente toda aquela informação. Procurava avaliar o peso que tudo aquilo teria tido para ele.
- Mas Hugo é mais velho… ele não perguntava?
- Apenas um ano de diferença! Era pequeno o suficiente para esquecer tudo e aceitar uma nova vida. Rapidamente deixou de nos chamar tios e nos passou a tratar por pai e mãe, tal como vocês duas!

Diana não sabia o que mais perguntar ou dizer. Mauro antecipou-se.
- Alguma outra pergunta que queiras fazer?...
Diana abanou a cabeça, sem encontrar mais palavras que fizessem sentido naquele momento.
- Aproveita agora porque quero enterrar o assunto de uma vez por todas! Não quero mais perguntas sobre esta história!
- Ficai descansado, meu pai. – Fora apenas o que lhe ocorrera.

Diana deu um beijo na face de Mauro, esboçando um leve sorriso e voltou aos seus afazeres. Quem entrasse naquele momento, pensaria que a manhã teria passado tranquila naquele lugar e que nada se tinha passado.

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