segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Sob a Marca do Dragão - Cap. 7 (parte 2 de 2)



Passado algum tempo e mais recomposta, Diana acabava por falar.
- Porque é que os nossos dragões querem a pele um do outro? - perguntava.
Rafael hesitou, mas não o podia adiar mais.
- Belchior, o teu avô materno, guardião do dragão da lua recebeu uma missão com o intuito de proteger a continuidade da irmandade. Ele tinha de acabar com a vida de um influente sacerdote da nova fé, que desconfiava das práticas de alguns elementos da irmandade e colocava em causa a sua existência. O meu avô acompanhou-o na missão... Esse homem foi morto, mas Belchior desapareceu, convenientemente, e Edgard, meu avô, foi acusado de bruxaria e morto por tal.

Diana ouvia em silêncio.
- Não conseguíamos perceber como o tinham conseguido, como tinham ludibriado o dragão ou inibido o seu poder até que descobrimos a razão! Era Belchior quem estava por trás da sua captura! - Rafael apertou os maxilares, mastigando aquele pensamento.
- Mas porquê?!
- Belchior cultivava, em segredo, um outro lado do seu poder...
- Outro lado?!...
- Ele reverenciava e servia o lado sombra da Deusa e do seu consorte! - Rafael respondeu olhando-a, agora de frente.

- Como assim?
- O lado do ciúme, do desejo, da posse, do ódio e da vingança... – continuou - Provavelmente querendo o poder dos dois dragões para si, não sei!...
- Mas o que aconteceu?
- Quando soubemos o que tinha acontecido, um tio meu procurou o sacerdote da nova fé que tinha investigado o caso. Ele foi até lá como membro da irmandade, pois considerou perigoso identificar-se como familiar. Esse homem contou-lhe sobre uma profecia que dizia que um guardião das sombras se revelaria atentando contra a fé na última Lua Negra antes de Ostara. Estava destinado que esse guardião das sombras tiraria a vida de um homem que semeava a fé e ameaçava o recuo das trevas. A missão foi incumbida a Belchior e bem sabemos que Edgard nada tinha a ver com as trevas que essa profecia refere!
- Então não sabem ao certo quem matou esse homem?
- Belchior, claro! Só poderia ter sido ele!... O mesmo sacerdote contou como Edgard foi encontrado junto de um cenário aterrador e em chamas, com símbolos de bruxaria e dizendo coisas sem sentido, debatendo-se com uma força de vários homens.
- Para esses homens as marcas que carregamos são símbolos de bruxaria e não me parece que concordes com a sua opinião.
- Claro que não! Os sacerdotes da nova fé diziam que ele tinha sucumbido sob o poder das trevas ou cedido o seu corpo a um ser demoníaco. Diziam que durante o julgamento que lhe fizeram, ele parecia por vezes conjurar algum poder malévolo, mas que o poder dessa fé foi mais forte e o venceu. Acredito que ele estaria apenas a procurar socorrer-se do seu poder, mas ainda sob o efeito de alguma outra magia. Não podes negar que algo de tenebroso se terá passado!

Pela forma como ele se movimentava de um lado para o outro e pela sua expressão, Diana notava como aquele assunto o afectava.
- Apenas sei o que estou a ouvir e digo que ainda não ouvi nada que provasse o quer que fosse contra Belchior ou mesmo Edgard!...

Rafael olhava-a perscrutando a sua mente, mas ela parecia continuar de guarda. Defendia Belchior? Decidiu continuar.

- Ninguém pôde assistir a esse julgamento nem deixaram que Edgard recebesse visita da sua família, mas meu pai procurou-o em espírito, através do poder do dragão. E o que ele encontrou foi uma mente mergulhada na escuridão. O que ele dizia não fazia sentido, mas repetiu algumas vezes o nome de Belchior como se quisesse contar alguma coisa.
- Mas não sabem o que queria dizer!...
- Podemos calcular. O meu pai sentiu algo mais na mente de Edgard... Vestígios da energia do dragão da lua! - dizia olhando-a com atenção.
- Vestígios?

Rafael aproximou-se.
- Da mesma forma que senti a tua energia quando me derrubaste perto da praça, naquele dia... Assim como sentiste a minha energia há pouco. Ele sentiu a energia do dragão da lua presente na mente de Edgard. Parecia, de alguma forma, estar sob o poder de Belchior. Foi fácil juntar as peças... Foi um choque para todos, mas as evidências apontam para a traição de Belchior!

Diana não sabia o que pensar, mas diversas perguntas se levantavam no seu espírito.
- E o que fizeram?
- O que podia ser feito? Procurámos Belchior, mas o cobarde simplesmente desapareceu!
- Nunca apareceu?
Rafael abanou a cabeça.
- Nunca mais foi encontrado.
- E o que fizeram?
- Se não foi encontrado nada pôde ser feito.

Não era o momento de dizer-lhe mais, pensava Rafael. Se ela nada tinha sabido até então...! Ele não conseguia perceber no que ela estaria a pensar. Desconfiaria de alguma ligação entre aquela história e a morte de seus pais?

Diana olhava-o, claramente com alguma questão em mente.
- E sobre os meus pais, o que sabes? - acabou por perguntar.
O que responder-lhe?, pensava.
- Que algo de trágico aconteceu e se pensava que toda a família tinha morrido; quem sabe talvez até Belchior, algures escondido na casa.
- Minha mãe pressentiu o perigo e tirou-me de lá a tempo. Mas se ela pediu a Alba que procurasse Belchior caso algo lhes acontecesse, é porque ele não estava lá!
- E que perigo pressentiu a tua mãe? - perguntou Rafael.
- É o que gostaria de saber... Poderia ser apenas o incêndio!

Enquanto ambos mergulhavam nos seus pensamentos sobre o passado, o presente e o futuro, instalou-se o silêncio.

- Preciso de encontrar Belchior ou saber o que aconteceu com ele!
- A minha família procurou-o durante anos sem qualquer êxito!
- Deve haver uma forma... Alguém que possa ajudar?! - Diana pensava em Selénia.
- Quem?
- Não sei, mas preciso encontrar quem me ajude a compreender e a controlar esta magia que carrego e não conheço! – disse enquanto caminhava de um lado para o outro.
- Os druidas da Irmandade podem ajudar-te.
- E dizer-lhes que tenho a marca do dragão?! Ficar ao seu serviço?! Não é uma ideia que me agrade.
- Mais tarde ou mais cedo terão de saber!
- Prefiro mais tarde do que mais cedo; ganhar tempo para saber o que fazer quanto a isso. Primeiro tenho de esclarecer o passado.
- ...
- E o que disseram os druidas sobre o que aconteceu?
- Perante as evidências, nada mais havia a dizer!

Diana voltou a aproximar-se, curiosa sobre a possibilidade de existência de um caminho que não tivesse sido explorado.
- E para além das evidências?
- Procuras defender Belchior?!
- Procuro compreender o que aconteceu!
- Nada mais existe que as evidências!

Rafael respirou fundo, procurando acalmar-se.
- Quem mais poderá ajudar-te senão os druidas? – continuou.
Diana olhou nos seus olhos.
- A minha ajuda seria muito básica. - disse, como se adivinhando o seu pensamento - Precisas de alguém que conheça o poder do teu dragão!
- Preciso de encontrar Belchior! – disse suspirando.

Diana sentia que pisar aquele terreno era como andar em círculos. A chave seria Belchior, mas como encontrá-lo?
- E se pedir a ajuda da Deusa? Dos meus antepassados? Ainda nesta lua teremos a celebração de Samhuin. O momento em que o véu entre os mundos se encontra mais fino será a altura apropriada para fazê-lo!

Essa era uma possibilidade que não o tranquilizava.
- O que estás a pensar fazer?
- Pedir ajuda a alguém. - dizia, enquanto pensava se seria seguro falar-lhe em Selénia. Porque não? Ele usava a magia!

- A alguém? Quem?
- Selénia, a Senhora do Bosque.
- Selénia, a feiticeira?!
Diana anuiu em silêncio.
- Não sei se será uma boa ideia!
- O que receias que aconteça?
Ele hesitou na resposta.

- O efeito que poderá ter sobre ti! – disse segurando o pulso de Diana, virando-o, como se procurasse recordá-la do seu dragão - Ainda não conheces o poder do teu dragão, como se manifestará ou como controlá-lo!

Ela soltou o seu pulso e afastou-se pensando em silêncio, mantendo-o de fora. Na sua mente surgia uma imagem de um homem envolto em trevas, do qual se destacava um olhar malévolo e um sorriso de satisfação. Pensava que a imagem que Rafael criara do seu avô devia estar a influenciar o seu julgamento. Afastou aquela imagem perturbadora, mas ficara presente uma ideia que a fez voltar-se para Rafael e olhá-lo com atenção.

- O que receias realmente? – acabou por perguntar.
- Disse-te que receio o efeito...
- Digo para além disso? - voltou a perguntar, interrompendo-o.
- Não estou a perceber...
- Receias talvez que encontre o meu avô e lhe siga as pisadas?
Ele calou a resposta.

- Ou talvez, pelo contrário, queiras que o encontre!... O que lhe aconteceria, então? Tu mesmo disseste que a tua família o procurou durante anos para fazer justiça!

Ela olhava-o com insistência, procurando ler algo, mas nada conseguia captar da sua mente. Aliás, estava convencida que esse era um poder que o seu dragão não lhe daria.
- Não me parece que o encontres. Acredito que de alguma forma já não vive entre os homens. – dizia Rafael, procurando escapar à pergunta que não queria ou não sabia responder. Ou talvez até soubesse! Se Belchior estivesse vivo, o seu destino mágico voltaria a ter sentido e seria fácil de cumprir! Poderia ser?

- Não sei se essa mulher é de confiança! – acrescentou, procurando dar outro rumo àquela conversa.
- Eu confio em Selénia!
- Conhecei-la?!
Diana anuiu.

- Ela sabe o que procuro e dispôs-se a ajudar. Poderá ajudar-me nesta busca... pelo menos chamando até mim a Visão! Qualquer pormenor que possa descobrir pode ser importante!
- Como é Selénia? 
- Parece-me ser uma boa mulher, disposta a ajudar, com boas palavras... Sinto dela uma energia forte e... muita tranquilidade! – terminou, olhando-o.

Teria de conhecê-la, pensava. Sentia que precisava de ficar de olho em Diana. E se ela encontrasse, de facto, Belchior? Claro que não poderia ser! Se ele estivesse vivo, não ficaria escondido ao descobrir o que tinha acontecido à sua família! A não ser que o guardião das trevas, como a tal profecia o chamava, não se importasse com o destino daqueles que tinham crescido sob a sua alçada! Poderia ser? E se assim fosse e Diana o encontrasse? Ela também poderia correr perigo! Ou não? Suas divagações não faziam qualquer sentido! Mesmo que não se importasse com a sua família, ele iria continuar atrás do dragão do sol, já que existiam descendentes adultos! Ou mesmo de outro dragão!? Não fazia sentido simplesmente desaparecer; era óbvio que este se encontrava morto! Preocupava-se em vão.

Diana repetia o nome de Rafael, tocando-lhe agora no braço para o resgatar dos seus pensamentos. Ao fazê-lo voltou a ver na sua mente a imagem dos seus dois dragões completando o círculo. O que poderia significar? Porque surgia tantas vezes nas suas ideias?

- Desculpa!... Revia tudo o que sei à procura de algo que me pudesse ter escapado e que pudesse ajudar!
- Se nada mais encontras, resta-me procurar Selénia.
- Posso ir contigo? – Diana parecia não saber o que responder – Talvez o dragão do sol possa lançar alguma luz sobre a tua demanda!
- Parece-me que já experimentei a luz do teu dragão e não me ajudou a ver com mais clareza!
- Na dose certa...! - disse ameaçando um sorriso e levantando as sobrancelhas.
- Parecias estar sempre a fugir do assunto e agora queres participar da minha demanda?!
- Agora já conheces a história!... E também gostaria de compreender o porquê!
- E se encontrarmos Belchior?
Ele riu.

- Não me parece possível. Mas quero saber o que lhe aconteceu!
- Não sei porquê, mas os meus instintos continuam a dizer-me que posso confiar em ti!
- ...Sim, podes. – acabou por responder, surpreendido pelo facto de Diana parecer confiar mais em si do que ele próprio. Não deveriam ser os seus instintos a falar, mas a sua ingenuidade, pensava. Iria, no entanto, ajudá-la. Também queria saber mais. Queria saber porque o seu destino mágico não se alterara.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Sob a Marca do Dragão - Cap. 7 (parte 1 de 2)


O latejar do dragão sob a pele do seu pulso e antebraço chamava a sua razão para a realidade à sua volta. Diana abria os olhos, piscando-os face à luz do dia e recordando o clarão que a tinha deixado desacordada. Olhou em volta e viu Rafael chegando junto a si. Recordou-se da morte que testemunhara e reagiu instintivamente, tentando afastar-se dele. Foi quando notou que as suas mãos e os seus pés estavam atados. Não podia fugir, pensava. Sentia-se alarmada, mas precisava manter a calma para encontrar uma solução. Rafael tinha-lhe dito uma vez que ela o tinha deixado desacordado. Como o teria feito? Ela só se lembrava do grito e da imagem da noite cerrada sem luar!...

Rafael olhava-a, tentando ler os seus pensamentos, mas Diana parecia ter-se prevenido.
- Onde estamos? O que queres de mim?
- Precisava de pensar no que fazer...
- O que vais fazer comigo?
- Não quero fazer-te mal, descansa.
- E porque estou atada?

Diana sentiu-o hesitar antes de responder. Sentia algo de diferente em Rafael, mas não percebia o quê. Também não se sentia mais alarmada, apenas curiosa, o que lhe causava estranheza.
- Precisei afastar-me um pouco... não quis arriscar chegar aqui e não te encontrar. - disse enquanto desembainhava o seu punhal e chegava mais próximo.

Rafael baixou-se e cortou a corda que atava os pés de Diana, aproximando-se de seguida para cortar a que prendia as suas mãos. Cortou-a, mas não se afastou. Continuava a olhar Diana, enquanto o punhal voltava à sua bainha e Diana esfregava os pulsos. Os olhos de Diana pousaram, então, nos seus e ali ficaram por algum tempo.

Diana sentia o seu dragão latejar mais do que alguma vez sentira. Desta vez parecera-lhe ver, pelo canto do olho, o sol do dragão de Rafael reluzir. Olhou o dragão. Nada acontecia, mas voltara a sentir-se alarmada. Voltou a olhar os olhos de Rafael e encontrou-os pousados na sua boca. Rápida e quase instintivamente, Diana desembainhara o punhal de Rafael para o encostar à sua garganta.
Rafael não o esperava, encontrava-se distraído, pensava. Ainda assim, como ela o conseguira fazer sem que ele o antevisse? Não sentia no entanto qualquer agressividade da sua parte.

Diana empunhava o punhal com as duas mãos, empurrando-o ligeiramente para que ele se afastasse. Rafael colocou a sua mão sobre as de Diana e forçando a lâmina contra a sua pele. Diana contraiu os braços de imediato, puxando-o de volta. Rafael sorriu.
- Tu não queres fazer-me mal!
Diana hesitou na resposta.
- Verdade. Não quero. Mas não hesitarei em fazê-lo se necessitar de me proteger!
- Não duvido! - respondeu Rafael sorrindo ao mesmo tempo que levantava as sobrancelhas - Se quisesse fazer-te mal já o teria feito. Não é meu hábito deixar testemunhas!
Dizendo-o, levantou-se, afastando-se dela. Diana continuou de punhal apontado na sua direcção, até considerar que este se encontrava a uma distância segura. Levantou-se, então, baixando o punhal.

- Hábito?! Isso significa que costumas andar por aí a matar pessoas!?...
- É tempo de conheceres mais sobre a responsabilidade dos portadores do dragão...
Diana aguardava, ansiosa, as suas palavras.
- O dragão e os portadores do seu poder servem e guardam a Irmandade do Amparo. A Irmandade cobre-se com os símbolos e roupagem da nova fé, mas o seu verdadeiro objectivo é proteger os conhecimentos dos antigos, o que é perigoso nos tempos que correm. A nós cabe-nos proteger os seus membros e pôr fim às ameaças que sobre eles possam pender. As missões são-nos entregues para serem executadas e não nos cabe a nós avaliar o seu alcance!

Mas Diana não podia evitar avaliar o alcance daquelas palavras e o tipo de missões que seriam encomendadas aos guardiões.
- Cada dragão-elemento fica residente na sua respectiva célula da irmandade - existem 5! O dragão da terra encontra-se na célula que fica a Norte, o dragão do fogo na que fica a Sul, o do ar a Este e da água a Oeste. Os dragões do sol e da lua circulam por todas as células, de acordo com as necessidades, reportando à célula central.
- E que tipo de missão era esta? - perguntou Diana.

Rafael permaneceu alguns momentos em silêncio, pensando no que deveria dizer.
- Este trabalho não foi pedido pela irmandade. - dizia, olhando-a atentamente.

Diana permanecia em silêncio, julgando ter sido um crime a soldo. O que a tinha feito pensar que podia confiar nele? Não se lembrava mais.
- Foi um pedido particular... - continuava ele - de uma mãe que queria ver terminados os abusos constantes a si e às suas filhas, perpetrados por aquele sentinela arrogante!
- E o que recebeste em troca?
- Um medalhão que pode valer uma boa cama... e néctar!
- Essa irmandade não providencia cama e néctar os seus guardiões? 

Acaso a sua expressão não o indicasse, o tom da sua voz deixava transparecer o seu desagrado. Rafael sorriu, aproximando-se e estendendo a mão enquanto olhava o seu punhal, ainda na mão de Diana.
- Como saberei se posso confiar em ti? Ainda há pouco me encontrava de mãos e pés atados!...
- Porventura não te soltei?
- Como posso confiar em alguém que é pago para resolver problemas pelas armas?

Rafael continuou a aproximar-se, chegando junto a si.
- Que risco corro? Tu também tens uma marca da magia na tua pele. Arriscar-te-ias a contar algo?
Diana olhou o seu pulso e ele continuou como se concluísse um outro pensamento.
- Com o poder do dragão da lua!... Chegará o momento em que o teu serviço será cobrado.
Diana permanecia em silêncio. Tal perspectiva deixava os seus cabelos em pé.

Rafael voltou a estender a mão, desta vez junto da sua, e o punhal foi-lhe devolvido, voltando à sua bainha.
- Como posso esconder a minha marca? - perguntou Diana com os olhos postos no seu pulso, afagando-o com a outra mão.

Diana levantou o olhar e observou-o em silêncio, até que ele respondeu.
- Pensa no teu dragão a recolher-se no interior do teu corpo.
Ela desatou o punho, descobriu o pulso e olhou o seu dragão, fixamente, por algum tempo.
- Nada acontece!... - disse finalmente.
- Calma. - respondeu ele, levando a sua mão à de Diana e segurando-a - Fecha os olhos.
Diana olhou-o demoradamente.
- Fecha os olhos! - repetiu.
Decidiu confiar, fechando-os.
- Vê nos teus pensamentos, o teu dragão espreitando através da tua pele. Consegues vê-lo?
Ela anuiu silenciosamente, sentindo a mão de Rafael formigar sob a sua e um estranho formigueiro subindo pelo seu pulso.
- Agora vê-o recuar dessa espécie de janela, para dentro do seu abrigo, recolhendo-se, escondendo-se. Até tu deixas de o ver!
Rafael não precisava perguntar mais nada, podia ver os seus pensamentos e podia ver o dragão da lua desvanecer-se sob a pele do antebraço de Diana.
- Agora que o teu dragão se recolheu às profundezas do seu abrigo, abre calmamente os teus olhos.
Diana abriu os olhos e olhou Rafael. Este sorriu indicando-lhe que olhasse para o seu antebraço. Diana fê-lo e sorriu maravilhada na ausência da sua marca. Voltou a olhar Rafael. Ele devolvia-lhe a atenção. Também podia sentir a energia fresca de Diana.

- Já sabes que consegues e como o podes fazer. – acabou por dizer.
- Consegui porque me ajudaste! Posso senti-lo!
Após um olhar demorado, Rafael largou a sua mão.

- Sentiste a minha energia a ligar-se com a tua. Só potenciei aquilo que se encontra em ti! Tu consegues fazê-lo! O poder do dragão corre nas tuas veias! – Terminou olhando novamente a marca do dragão Diana.

 Diana voltou a olhar a pele do seu pulso e voltou a sorrir pela ausência do seu dragão. Este apareceu de imediato, desvanecendo-se o seu sorriso.
- Vês?! Desapareceu!
- As nossas energias já não estavam ligadas. Eras tu a fazê-lo! Só tens de treinar a tua concentração e confiar em ti mesma.

Na mente de Diana, surgiu uma imagem que lhe era familiar: a de ambos beijando-se, sentindo-se mutuamente. Rafael captara a imagem. Olharam-se demoradamente. Ele aproximou-se ainda mais e, num ímpeto, dirigiu os seus lábios aos dela. Diana respondeu ao seu avanço sem pensar, devolvendo-lhe o beijo. Sentiu não o controlar.

No momento seguinte o seu coração falhou um batimento. Ela assustou-se, mas continuava a sentir que não o conseguia controlar. Sentiu o seu coração falhar nova batida e o ar a deter-se de entrar no seu corpo. Momentos depois o coração voltou a bater e o ar a voltar a entrar, fresco, no seu peito. No momento seguinte nova paragem, sem conseguir respirar, sem conseguir que o sopro vital animasse o seu ser. E, uma vez mais, voltando ao normal. A cada batida que o seu coração falhava e a cada respiração frustrada, o sufoco se tornava maior, o ar mais necessário e as forças iam fraquejando, naquilo que Diana sentia como uma luta entre os dragões, uma luta pelo ar que respiravam e pela vida que fazia com que os seus corações continuassem a bater. Não percebia porque o seu coração ou os seus pulmões pareciam obedecer a esta estranha luta que parecia acontecer apenas na sua mente. Será que era apenas a sua mente? Será que era uma ilusão, fruto da magia? Parecia-lhe deveras real! A cada batida que sentia o seu coração falhar, ela via na sua mente o dragão do sol fortalecer-se. Quando o seu coração batia, parecia travar uma luta interna para recuperar as forças, o ar e a própria vida. A um ritmo que fugia à sua vontade, esta luta arrastou-se por aquilo que lhe pareceu uma eternidade, embora ameaçando o fim a qualquer instante.

Num esforço desesperado e reunindo todas as suas forças, Diana conseguiu afastar-se de Rafael e quebrar aquele beijo que parecia sugar-lhe a vida. Recuperando o fôlego e as forças, olhou então Rafael a uma distância segura. Teria sido imaginação sua? Uma luta entre dragões? Rafael também parecia ofegante! Sentia-se enfraquecida, mas o seu dragão vivo, em si.


Rafael não contava com o que tinha acabado de acontecer, mas pensava que só podia ter a ver com o seu destino mágico.